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A orla quase perfeita. Cadeiras reclináveis, sombreiros padronizados, ambulantes mantendo distância regulamentar um do outro e, claro, uma bela vista para o mar. Isso, na praia de Piatã, hoje uma das mais charmosas de Salvador. A poucos metros dali, na praia ao lado, Itapuã era o exemplo da desordem. Cadeiras e mesas de plástico amontoando-se na areia, sombreiros velhos e sem padronização, ambulantes irregulares, enfim, poluição visual no paraíso.
Em uma semana de intensa fiscalização da prefeitura, a Orla da capital baiana viveu um domingo de contrastes. Entre todas as praias, Itapuã parece ser a maior resistência ao ordenamento. Na quarta, uma operação da Secretaria de Ordem Pública (Semop) revoltou os barraqueiros, que tiveram 1,1 mil equipamentos apreendidos. Um dos ambulantes, em Itapuã, ateou fogo em 16 banheiros químicos como represália.
Ontem, os mesmos barraqueiros que perderam materiais voltaram ao local. Carregamentos com mesas e cadeiras plásticas, além de sombreiros sem padronização, chegavam a todo momento. Bastou a fiscalização passar para a praia ser tomada. “Quantas vezes eles levarem minhas coisas eu vou voltar. Eu só sei fazer isso da vida”, bradou Juliana Montenegro, uma das poucas ambulantes que se dispôs a falar.
A maioria se mostrou hostil com a presença da reportagem. Uma outra ambulante denunciou a falta de critérios da prefeitura na escolha dos permissionários e a pequena quantidade de kits distribuídos. “Muita gente das antigas ficou de fora. Somos a favor da organização, mas também queremos justiça na distribuição dos kits. Até quem era só garçom virou barraqueiro”, afirmou, sem se identificar.
A fiscalização da Semop disse que vai intensificar a atuação em áreas críticas, como Itapuã. “A Orla de Salvador é muito extensa. Alguns locais são realmente mais críticos, mas aos poucos estamos conseguindo vencer a resistência”, afirmou o coordenador de fiscalização, Braz Pires. “É uma briga de gato e rato”, comparou a secretária de ordem pública, Rosemma Maluf.
Até sexta, a operação da prefeitura contabilizou 1.733 apreensões e continua até 22h de hoje. Em praias como Piatã e Jardim de Alah, tudo no domingo parecia funcionar como quer a prefeitura. Somente a cobrança pelos kits continua acontecendo. “Quando o camarada vai consumir eu não cobro. Mas usar o kit trazendo comida e bebida de graça é demais. Aí a gente acerta um preço”, argumentou o permissionário Wellington Rodrigues.
Alguns poucos ainda resistem e usam sombreiros e cadeiras que não integram o kit. Mas quase todos estavam padronizados. No Porto da Barra ainda há certa tensão. Barraqueiros antigos não incluídos entre os permissionários continuam atuando no local, mesmo entre a maioria regular. Eles reclamam que sobram clientes e falta estrutura para atendê-los.
“Como é que 20 cadeiras e dez sombreiros para tão pouca gente vão dar conta?”, pergunta Andreza Gomes, garçonete de um ambulante que atua irregularmente. Já o barraqueiro Wellington Teixeira, 60 anos, disse que atua há mais de 30 no Porto. “Criei meus cinco filhos com a praia. Agora vivo fugindo do rapa, colocando cadeira e sombreiro aqui e ali quando dá. Não sou ladrão, não”.
Fonte: Correio 24 horas